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  • Foto do escritorVictor Axhcar

“O Semeador e o Ladrilhador” - Crítica

Atualizado: 13 de mai. de 2019

Sérgio Buarque de Holanda nasceu em 11 de julho de 1902 em São Paulo. Formado em direito pela Universidade do Brasil, foi um dos principais historiadores brasileiros, mas também atuou como professor, jornalista e crítico literário. Quando estava trabalhando para o Diários Associados na Europa, conheceu a obra de Max Weber e quando retornou ao Brasil em 1936 passou a lecionar História Moderna e Contemporânea na Universidade do Distrito Federal, que na época ficava localizada no Rio de Janeiro, e publicou o clássico “Raízes do Brasil”, coincidindo com um período em que diversos autores brasileiros buscavam no Brasil colonial subsídios que explicassem o país contemporâneo.

O capítulo “O Semeador e o Ladrilhador” do clássico ensaísta brasileiro trata a respeito de como a disposição urbana de um determinado local reflete com grande precisão as motivações psicológicos e de mentalidade de um determinado povo ou cultura.

Utilizando-se da dualidade pautada no tipo ideal de Max Weber, o autor utiliza a formação da cidade como ideia-chave, sendo ela um instrumento de dominação, fundada para fazer presente a figura da metrópole, bem como a centralização do poder nas mãos desta. Para Portugal suas colônias eram grandes feitorias. Enquanto a colonização portuguesa se concentrou predominantemente na costa litorânea, a colonização espanhola preferiu adentrar para as terras do interior e para os planaltos.

Nesse sentido, o espanhol é denominado “ladrilhador”, pelo seu zelo urbanístico baseado na razão, na uniformidade e simetria, além da predominância da linha reta, com preferência às regiões internas, “o interior é o seu interesse”. Algo que vale ressaltar é que os espanhóis buscavam constituir no Novo Mundo o Velho Mundo, o que explica a o significado de cidades bem estruturadas e com traçados retilíneos.

Já os portugueses estabeleceram uma politica de feitoria, “semeadores” de cidades irregulares, crescidas e fixadas sem controle, próximas ao litoral, o que demonstrava o seu caráter mercantil, devido à facilidade de escoamento de seus produtos através do mar, movidos pela rotina das experiências pelas quais se guiavam. São cidades que crescem verticalmente e que possuem um caráter altamente imediatista, o que comprova o espírito aventureiro relativo aos lusitanos, quando estes têm em mente apenas aquilo que deve ser alcançado e não relevando os obstáculos, marcando potencialmente uma diferença em relação aos espanhóis, mais visionários, organizados e renovadores da realidade que se apresentava no continente americano.

Para o autor, os espanhóis queriam adequar seus costumes a vida na colônia, reproduzindo na colônia seu dia a dia e seus costumes. E essa diferença na forma de colonizar se baseou no fato de os espanhóis terem encontrado em suas terras ouro e metais preciosos logo em seu descobrimento.

Enquanto isso, os portugueses viam a terra como espaço de passagem, para ganhar dinheiro e nada mais, já que a única riqueza encontrada, a princípio, tinha sido o pau-brasil. Um exemplo dessa diferença está na educação, os espanhóis fundaram 23 universidades em suas colônias, ao passo que os moradores da colônia portuguesa precisavam transpor o oceano para estudar. Apenas quando foram descobertas as minas, sobretudo as de diamante, foi o que determinou Portugal a por um pouco mais de ordem em sua colônia. No Brasil, a exploração litorânea foi facilitada pelo fato de a costa ser habitada por uma única família de indígenas, que de norte a sul falava um mesmo idioma. E é esse idioma que há de servir para o intercurso com os demais povos do país, mesmo os de casta diversa.

Pouco importa aos nossos colonizadores a disciplina, se não for para servir aos seus interesses imediatos. A forma em que nossas cidades se dispunham, comparadas às da América Espanhola, é um reflexo disso. A cidade que os portugueses construíram na América não contradiz o quadro da natureza, sua silhueta se enlaça na linha da paisagem. Nenhum rigor, nenhum método. O princípio que norteou a atividade colonizadora dos portugueses foi a rotina, não a razão abstrata. A ordem que aceitam é a do semeador, desleixada e livre, não a do ladrilhador, feita com o trabalho dos homens.

Sérgio Buarque de Holanda nos faz perceber uma preocupação muito grande em projetar na América uma "Nova Espanha", onde a Espanha se reconstrói perfeitamente racional no mundo americano, não havendo nem mesmo espanto e admiração pelas civilizações avançadas que eram encontradas.

Portugal, no tempo de descobrimento do Brasil, há estas alturas já havia experimentado esta euforia racional bem antes dos espanhóis. A consolidação do Estado nacional de Portugal havia ocorrido ainda no século XIV e às alturas de 1500, já havia conquistado um Império mundial experiente, calejado, ciente das dificuldades de manutenção de todo aquele mundo ultramarino. Não é à toa que Portugal só viria a dar a devida importância às terras que havia "descoberto" na América já na segunda metade do século XVI quando a concorrência com os holandeses na intrincada disputa do mundo conhecido já havia se acirrado consideravelmente - sobretudo na Ásia. Portugal desenvolveu, na realidade, um modelo único de administração colonial pautado na praticidade e na crença de desenvolvimento autônomo.

Enfim, com as informações apresentadas neste capítulo, quando o autor compara as colonizações portuguesas e espanholas, de certa forma, cria no imaginário do leitor a imagem de uma Espanha que possuía somente boas intenções em suas motivações para colonizar outros territórios, sendo que na verdade, assim como Portugal, seus principais objetivos também eram comerciais.

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