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  • Foto do escritorVictor Axhcar

Construção - Crítica

Atualizado: 12 de mai. de 2019





Muitas pessoas associam o álbum Construção (Philips, 1971) a tomada de posição política de Chico Buarque. Mas isso é um erro. Em 1965, um ano após ter começado a construir obra monumental, o compositor carioca já apresentou músicas feitas com letras pautadas por forte consciência social, casos dos sambas Pedro pedreiro (1965), Malandro quando morre (1965) e Tamandaré (1965).

Construção marcou na obra de Chico uma evolução poética na arquitetura das letras e uma ousadia estilística por conta dos arranjos do maestro Rogério Duprat (1932 – 2006) e de Antônio José Waghabi Filho (1943 – 2012), o Magro do grupo MPB4. 

A evolução poética é perceptível sobretudo na engenhosidade métrica da música-título, que conta o dia de um trabalhador da construção civil. A composição sonora da letra e a sua relação com a melodia musical fazem dela uma das mais brilhantes da Música Popular Brasileira.

O ritmo é um elemento essencial na poesia, e ainda mais importante na canção, onde a letra e a melodia se unem. Na composição de Chico Buarque, boa parte do ritmo é dada pela métrica dos versos.  O formalismo que marca a música junto com a narrativa do dia de um operário que morre em serviço acaba servindo para uma crítica social. A alienação do trabalho marca o operário como uma máquina, destituída de características humanas, que serve apenas para executar ações.

Além de ter marcado mais uma vez a posição de Chico Buarque, Construção foi o disco em que a inclusão passou a ocupar maior espaço no cancioneiro do artista no lugar do lirismo que pautou parte da obra do compositor nos anos 1960. 

Primeiro álbum inteiramente gravado por Chico no Brasil após a volta do autoexílio na Itália, em 20 de abril de 1970, Construção foi o segundo álbum feito pelo cantor na Philips, gravadora multinacional com a qual Chico assinou contrato em 1970 após passagem inicial pela brasileira RGE. O primeiro álbum do artista na companhia, lançado em 1970, ainda teve as vozes do cantor captadas em estúdio de Roma. 

Uma das obras-primas da discografia de Chico Buarque, Construção foi composta durante um período de forte repressão da ditadura militar no Brasil, e Buarque consegue, através de sua música, reunir crítica social, lirismo, rigor técnico, a angústia humana e a inquietação filosófica. Mesmo tendo sido lançado há quase meio século, o álbum segue atual, instigante e provocador. Não à toa, em 2009, a revista Rolling Stones considerou a faixa-título como a melhor canção brasileira de todos os tempos.



Letra de Construção 


Amou daquela vez como se fosse a última Beijou sua mulher como se fosse a última E cada filho seu como se fosse o único E atravessou a rua com seu passo tímido


Subiu a construção como se fosse máquina Ergueu no patamar quatro paredes sólidas Tijolo com tijolo num desenho mágico Seus olhos embotados de cimento e lágrima


Sentou pra descansar como se fosse sábado Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago Dançou e gargalhou como se ouvisse música


E tropeçou no céu como se fosse um bêbado E flutuou no ar como se fosse um pássaro E se acabou no chão feito um pacote flácido Agonizou no meio do passeio público Morreu na contramão, atrapalhando o tráfego


Amou daquela vez como se fosse o último Beijou sua mulher como se fosse a única E cada filho seu como se fosse o pródigo E atravessou a rua com seu passo bêbado


Subiu a construção como se fosse sólido Ergueu no patamar quatro paredes mágicas Tijolo com tijolo num desenho lógico Seus olhos embotados de cimento e tráfego


Sentou pra descansar como se fosse um príncipe Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo Bebeu e soluçou como se fosse máquina Dançou e gargalhou como se fosse o próximo


E tropeçou no céu como se ouvisse música E flutuou no ar como se fosse sábado E se acabou no chão feito um pacote tímido Agonizou no meio do passeio náufrago Morreu na contramão atrapalhando o público


Amou daquela vez como se fosse máquina Beijou sua mulher como se fosse lógico Ergueu no patamar quatro paredes flácidas Sentou pra descansar como se fosse um pássaro E flutuou no ar como se fosse um príncipe E se acabou no chão feito um pacote bêbado Morreu na contramão atrapalhando o sábado



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